Em 2012, a XP Inc. era uma corretora de valores com 80 mil clientes, R$ 4-5 bilhões em ativos sob custódia e um lucro líquido de aproximadamente R$ 50 milhões ao ano. Treze anos depois, a empresa administra R$ 1,4 trilhão em ativos e projeta um lucro líquido superior a R$ 5 bilhões em 2025. Um crescimento de 100 vezes.
Essa trajetória não foi linear. Houve anos de queda, crises de mercado, decisões irreversíveis e uma transformação profunda no papel do fundador. A parceria entre Guilherme Benchimol, fundador da XP, e Martín Escobari, investidor da General Atlantic, é um estudo de caso sobre como founders e investidores de longo prazo constroem empresas que não apenas sobrevivem, mas dominam mercados.
A Mentalidade do Founder: Independência, Caixa e o Trauma como Combustível
A relação entre Benchimol e Escobari começou de forma inusitada. Benchimol não estava buscando investidores. Ele ignorou os primeiros três e-mails de Escobari. A razão era simples: sua obsessão não era crescer a qualquer custo, mas aprender a gerar caixa e conquistar independência financeira.
Essa mentalidade foi forjada por um trauma específico: a demissão. Benchimol foi demitido de um emprego anterior e jurou que nunca mais permitiria que alguém tivesse esse poder sobre ele. Essa experiência moldou sua filosofia de negócios: uma empresa só é livre quando não depende de ninguém para sobreviver.
O Critério do Investidor: Trauma e Obsessão
Escobari, por sua vez, desenvolveu um critério de investimento contraintuitivo: ele só investe em founders "traumatizados". Não qualquer trauma, mas aquele que gera uma obsessão produtiva. O trauma de Benchimol gerou uma obsessão por independência financeira e geração de caixa, o que, no contexto brasileiro de juros altos e acesso limitado a capital, é uma vantagem competitiva poderosa.
Esse alinhamento entre a obsessão do founder e a tese do investidor é o que diferencia parcerias de longo prazo de transações financeiras de curto prazo. Escobari não estava apenas comprando uma participação em uma corretora; ele estava apostando em um founder que, por natureza, construiria um negócio sustentável e lucrativo.
Enquanto Benchimol focava no operacional, Escobari buscava um padrão global.
Ele estudou os grandes acertos da General Atlantic e encontrou a tese: a desbancarização do mercado americano com a ascensão da E-Trade nos anos 90. Em 1995, os bancões americanos detinham 80% do mercado de distribuição de produtos financeiros. Com a internet, a E-Trade cresceu 30 vezes em cinco anos, e os bancões caíram de 80% para 10% de participação de mercado.
A pergunta de Escobari era: "Qual é a E-Trade brasileira?". A resposta foi a XP. Em 2012, menos de 100 mil brasileiros possuíam ações. A concentração bancária era absoluta. A oportunidade de desbancarização era evidente, mas o mercado brasileiro ainda não havia validado essa tese.
Essa dinâmica ilustra a diferença entre a visão do founder e a do investidor. O founder está obcecado em resolver um problema específico e gerar caixa. O investidor de Venture Capital está buscando uma tese macro, um padrão de disrupção que pode ser replicado em um novo mercado. A mágica acontece quando essas duas visões se alinham.
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A Transição Mais Difícil: De Operador Fanático a Líder Estratégico
A entrada da General Atlantic em 2012 marcou um ponto de inflexão na trajetória de Benchimol como CEO. Até então, ele era um operador fanático, envolvido em cada detalhe da empresa. Ele decidia a cor dos botões, gerenciava planilhas e estava presente em todas as decisões operacionais. Essa fase foi essencial para o sucesso inicial da XP, mas se tornou um gargalo quando a empresa atingiu 500 funcionários.
Escobari identificou o problema e fez a intervenção:
"Guilherme, é importante que você passe a ser um líder, um gestor. É importante que a gente ajude você a montar um plano de longo prazo, e você passe a se concentrar no momento atual da companhia, que é um momento de ter gente boa."
A Armadilha do Sucesso Inicial
Essa transição é uma das mais difíceis para founders. O sucesso inicial vem da execução fanática, da capacidade de trabalhar por 10, por 20, por 30. Você é o executor, o solucionador de problemas, o "faz-tudo". Mas a escala exige uma nova habilidade: gestão de pessoas, cultura, meritocracia e alocação de capital.
A armadilha é que você teve sucesso sendo quem você era. Agora, você precisa abandonar o que te trouxe até aqui e aprender a ser alguém que você não sabe como ser. Isso é contraintuitivo e psicologicamente desafiador.
Os Pilares da Liderança Estratégica
A transição de Benchimol envolveu quatro pilares:
Gestão de Pessoas: Aprender a contratar, desenvolver e, quando necessário, desligar pessoas. A empresa cresceu de 500 para 8.000 funcionários. Isso não é possível com microgerenciamento.
Cultura e Meritocracia: Criar um ambiente onde as pessoas certas prosperam e as pessoas erradas saem naturalmente. A meritocracia não é um valor abstrato; é uma prática diária de avaliação e feedback.
Planejamento de Longo Prazo: Sair do modo "apagar incêndios" e começar a pensar em horizontes de 3, 5, 10 anos. Isso exige disciplina e a capacidade de dizer "não" a oportunidades de curto prazo.
Alocação de Capital Inteligente: Aprender a decidir onde investir os recursos da empresa para maximizar o retorno de longo prazo. Isso inclui aquisições, expansão de produtos e investimento em tecnologia.
Essa transição permitiu que a XP crescesse de R$ 4-5 bilhões em ativos para R$ 1,4 trilhão. Sem ela, a empresa teria estagnado.
Risco, Resiliência e a Mentalidade Contraintuitiva nos Momentos de Crise
A jornada da XP não foi uma linha reta. Os dois anos seguintes ao investimento da GA (2013-2014) foram os piores da história da empresa. Em 2013, a XP fez R$ 70 milhões de lucro. Em 2014, o lucro caiu para R$ 45 milhões. Foi o único ano em que a empresa não cresceu.
A Cobrança Interna e a Aposta de Longo Prazo
Escobari foi cobrado internamente na General Atlantic. Em uma reunião com 300 pessoas, seu chefe apontou o investimento na XP como um dos grandes erros do ano. A empresa não havia entregue o prometido e continuava sendo uma corretora, não a plataforma de investimentos que Escobari havia vendido ao comitê.
A resposta de Escobari foi: "É muito cedo para saber." Ele manteve a aposta. Quando a XP fez o IPO e a GA realizou um lucro de US$ 2 bilhões, Escobari ligou para o ex-chefe e disse: "Te falei que era muito cedo."
A verdade é que a maioria dos fundos de Venture Capital tem um horizonte de 5-7 anos. A General Atlantic manteve a parceria por 13 anos. Esse horizonte de tempo permitiu que a XP navegasse por crises de mercado sem a pressão de entregar resultados trimestrais artificiais. Aqui entra o papel do founder de escolher um investidor alinhado, desde o começo, com os planos da empresa.
A Filosofia de Risco: Serra com Neblina vs. Estrada Alemã
Benchimol descreve sua filosofia de risco com uma analogia poderosa: "Se eu estou numa serra com neblina, eu vou andar devagar. Mas se vejo na frente uma estrada alemã, estou sentado num super carro esportivo, pé embaixo, porque isso é conservador."
A lógica é contraintuitiva. O que é conservador não é evitar riscos, mas minimizar riscos em situações de incerteza e maximizar velocidade em situações de clareza. Tudo que a XP fez começou pequeno: um funcionário, dois, três, quatro. Quebrando a cabeça, descobrindo o caminho. Quando o caminho ficou claro, a empresa acelerou.
Essa mentalidade é o oposto do que a maioria dos founders faz. Eles tentam começar grande, com um plano de negócio perfeito, e acabam quebrando porque o mercado não validou as premissas. A abordagem da XP foi: comece pequeno, valide, corrija, e só então acelere.
O Dever de Casa do Fundraising: Aprenda a Ganhar Dinheiro Primeiro
No final da conversa, Benchimol e Escobari dão o conselho final para founders que estão buscando capital. E o conselho é direto: aprenda a ganhar dinheiro primeiro.
A Visão do Investidor: Time, Fogo e Trauma
Escobari explica que, quanto mais cedo a rodada, mais o investimento é sobre o time e o "fogo" do fundador do que sobre os números. Ele precisa ter clareza sobre por que você, especificamente, é a pessoa certa para resolver esse problema. Qual é o seu trauma? Qual é a sua obsessão?
Mas essa clareza só vem quando você já deu alguns passos. Quando você já validou que o problema é real, que a solução funciona e que você consegue gerar receita.
A Visão do Founder: Dá Teu Jeito
Benchimol é ainda mais direto: "Se eu fosse um investidor, eu queria investir em empresas que têm empreendedores que já aprenderam a ganhar dinheiro. Você quer aprender a ganhar dinheiro? Dá teu jeito aí. Se vira, chama dinheiro do pai, do amigo, vende a casa, vende o carro, bota aí, quebra a cuca e dá um jeito. Porque se você aprender a ganhar dinheiro, fica muito fácil convencer o fundo a escalar o teu negócio."
O Momento Certo para Buscar Capital
O momento certo para buscar capital é quando você já tem um "risco bom". Quando você já validou o modelo, já tem tração inicial e já sabe que, com mais capital, você pode acelerar. Nesse momento, o investidor não está comprando uma ideia; ele está comprando uma máquina de crescimento que precisa de combustível.
O Raise Camp não é para quem tem apenas uma ideia. É para founders que já deram o seu jeito, que já têm tração inicial e que agora precisam de um copiloto para escalar o negócio com capital de risco.
Se você já aprendeu a ganhar dinheiro e agora precisa da estratégia para convencer os melhores fundos a investirem no seu negócio, conheça o Raise Camp. O Raise Camp é o nosso programa intensivo preparação para captar investimento, atuando como um Copiloto de fundraising para founders que miram R$ 2–20 milhões com Anjos e fundos de Venture Capital.
Um abraço,
José R. Bernardoni

